Racismo, Homofobia, Marco Feliciano e o Enfrentamento
Os líderes evangélicos, pós-evangélicos, pentecostais, neo-pentecostais .. Como queiram chamar, utilizadores da mídia televisiva, alcançaram níveis de evidências sem precedentes no Brasil. Alguns enveredaram na carreira política e estão ocupando cargos estratégicos com muita visibilidade, caso do Marco Feliciano.
Recentemente, ele assumiu a Comissão dos Direitos Humanos na Câmara dos Deputados, sob veementes protestos por parte de movimentos organizados e articulados, defensores dos direitos dos negros e homossexuais, em Brasília.
A pressão que este popular pastor recebe nestes dias, leva-me a refletir acerca do nível de preparo, sensibilidade e profundidade da liderança midiática.
Neste contexto fui provocado por uma amiga, residente na Capital Federal em assistir a um vídeo com o Pr. Marco Feliciano pronunciando-se em um culto, defendendo-se das críticas e protestos direcionados a ele. Após assistir o vídeo analisei:
Ele alegou que Noé amaldiçoou os povos descendentes de Cam e este povo é o povo negro africano – Comento: A questão da maldição de Noé já se perdeu nos milênios passados e não há traços ou evidências concretas para se afirmar esta relação com o referido povo.
Trazer aspectos de guerras, desastres e doenças epidêmicas contemporâneas (este exemplo foi citado no vídeo), atrelados a Noé e sua maldição é de um simplismo constrangedor.
Quando o pastor deputado afirma, na gravação, ser a maioria da população da África do Sul composta de brancos – na verdade a população branca não passa de 13% – ele se expõe como um desconhecedor básico de geografia.
Quase todos os povos, nos diversos continentes, historicamente, tiveram seus auges como civilização: Os Maias, os Astecas, os Incas (nas Américas), Mongóis na Ásia, inclusive os povos africanos. Temos evidências, se ficarmos apenas com a Bíblia, referentes à civilização avançada na Etiópia.
A Europa branca foi vitima de pestes devastadoras e guerras infindáveis. O continente passou por um genocídio sem precedentes na história da humanidade na primeira metade do século XX (primeira e segunda guerra), dezenas de milhões de pessoas mortas; no Japão bombas em Hiroshima e Nagasaki, furacões que arrasaram partes dos EUA, terremotos devastadores com tsunamis desastrosos…
O que ocorre são misturas de fatalismos com realidades geológicas e climáticas combinadas com a dureza de coração, cobiça, mesclado com intolerância, ambição e ódio, entranhado como realidade estrutural – pecado – nos humanos que povoam o planeta.
Neste contexto temos um Deus bom que intervém, quando quer, promovendo livramentos, impedindo que os homens se destruam, não importando cor da pele.
Uma análise grave e muito preocupante é a constatação de que a cultura racista velada, às vezes “aveludada”, brasileira gerou várias gerações com discursos, ações e reações racistas.
Não chegamos a ter em nossas igrejas evangélicas e nas correlatas, a separação-apartheid, pela cor da pele: igreja para brancos e igreja para negros. O apartheid aqui é social: igrejas para ricos e igrejas para pobres. Esta realidade é mais corriqueira do que muitos imaginam.
O racismo em toda a sociedade brasileira é muito medonho pelo seu caráter hipócrita e implícito. Ilustro o que quero expor com este exemplo: Conheço alguns pastores evidentemente negros (o evidente é em função da miscigenação ampla no Brasil), com discurso de branco, quando analisam a questão do racismo, não se situam no contexto, na condição de negro que o são. Inclusive Marco Feliciano é um mestiço que não se reconhece como tal.
A minha tristeza é pelo fato de que estes pastores, á exemplo de muitos líderes em outras esferas na sociedade brasileira, não querem despertar, muito menos assumir a sua negritude. No geral o negro brasileiro, apesar da visível evolução de consciência racial refletida em todas as esferas sociais, a maioria, infelizmente, ainda se “embranquece” no discurso e na aparência – estética, para aceitar-se e ser aceito pelo outro.
Quanto ao homossexualismo: na gravação, o pastor expõe a temática de forma pejorativa, sem respeito algum e sem profundidade. A posição bíblica deve ser defendida, mas evitando termos ou construção de imagens caricaturadas e depreciativas ao homossexualismo.
Um detalhe sério no contexto do Brasil contemporâneo: a realidade fora dos limites dos templos é outra. A população no geral observa os evangélicos, principalmente os televisivos, com muita atenção e fiscalização. Parece que boa parte dos pastores midiáticos ainda não percebeu.
Existe um seguimento “evangelicofóbico”, esta parte da população não vai ser “convencida” ou “acalmada” só com argumentos bíblicos, nem com as técnicas usuais de persuasão e manipulação emocional corriqueira. Eles estão atentos às ações lesivas, de exploração e engano, há anos, praticadas impunemente, por nossos ágeis e competentes animadores.
Os pastores televisivos têm adversários ardilosos, maliciosos, conhecedores da lei e de nuances por trás delas, querer adentrar em “territórios do poder”, por décadas controladas por eles, é perigoso.
Na mesma reflexão o Estado é laico e não tem as Escrituras como referência norteadora. Os pastores da TV precisam se embasar mais na temática do racismo e homossexualismo, do índio, da mulher, ler mais sobre o assunto, perceber as informações bíblicas sobre as minorias em seu contexto, no ângulo correto.
Acrescento: O seguimento mais visível do “mundo gospel”, pratica uma ética comprometida, frágil, para não escrever quase inexistente. Precisam tapar as suas brechas com um bom material chamado confissão e arrependimento, apelando para a graça plena em Jesus.
Mais ainda não é o fim,
Pr. Pedro Luís é Missionário com vasta experiência e diretor do Seminário da JUVEP na cidade de Itaporanga no Sertão da Paraíba.